COISAS DE MULHER
O final de semana era um tormento na cabeça de Nicinha, porque o maridão Oscar se embonecava todo no poleiro, só esperando dar meia-noite para sair batendo as asas e desencantar para o mundo.
—
Contagem regressiva... Bora curtir! Buenas.
Não
adiantava reclamar, fazer chantagens ou dormir na casa da mamãe. A reunião com
os amigos do boteco era sagrada e não tinha folga ou dia Santo.
Com lágrimas nos olhos ela gritava que Oscar não era mais aquele de antigamente e que havia se transformado em um monstro cruel. Sentia-se uma pobre coitada e dona exclusiva de dois quilos de bob’s. Mas, pra quê? Simplesmente para ele gandaiar com um monte de homens peludos e voltar no outro dia cedinho com aquela cara de “peixe frito”, como se nada tivesse acontecido!
— Eu odeio você, Oscar! Você não sabe valorizar a mulher que está ao seu lado. Você é vulgar e falso!
E
como ficaria o seu coração de mulher?
Então, só de birra, comia tudo o que tinha na geladeira, tentando vencer a solidão abraçada na panela de macarronada e panquecas rechonchudas.
Oscar fazia chantagem, dizendo que voltaria sozinho para Minas Gerais, e só de medo da solidão, Nicinha fingia em concordar com tantas picaretagens. Ele sempre estava engomado; roupinha da moda, cabelinho com gel, sapato bico fino, desfilando pelos ladrilhos do quintal a procura da chave do fuscão dourado.
Ela nunca estava penteada, cheirosa ou sensual.
Nicinha se resumia em uma camisola florida com manchas de cloro, um chinelo de dedos e perfumada naturalmente por cremes de cebola.
Às
vezes passava de leve o olhar sobre a própria mulher e suspirava aliviado por
saber que ainda tinha os amigos de boteco.
Não
que desgostasse de Nicinha, pois sempre foi uma pessoa interessante e tinha lá
a sua graça, mas de uns tempos pra cá relaxou de vez. Ficou implicante,
ranzinza e o único lugar que a deixava descontraída era a feira, onde soltava a
voz brigando com os vendedores.
—
Ovo caro, hein? Pastel de vento! Couve murcha...
Depois
voltava pra casa muito mais tranqüila. Com a gola do vestido toda suja de caldo
de cana, se esbugalhava no chão da sala, folheando uma fotonovela.
Os
amigos de Oscar conheciam Nicinha apenas por fotografia, aquela bem antiga, que
foi tirada no baile de formatura.
Na
sua última briga com ele, não quis saber de mais nada, arrumou as suas malas e
evaporou para bem longe dali.
—
Vou sumir da sua vida, palhaço!
Enquanto
o ônibus chacoalhava, a sua vida foi passando feito um filme diante de seus
olhos e percebeu que também havia contribuído para o triste fim do seu romance
depenado.
—As pessoas só fazem com a gente
aquilo que permitimos. Muitas vezes por falta de amor próprio. —concluiu.
Nicinha
foi para casa da mamãe na cidade de Jambeiro, apenas para se reciclar e voltar
muito mais poderosa.
Deu
um bom corte no cabelo e pintou de preto azulado. Trocou todo o guarda-roupa no brechó
da esquina e ressuscitou para o mundo.
Voltou
para casa na pontinha dos pés, fazendo uma surpresa para o maridão.
Quando Oscar se engomava para mais uma noite
no “crime” e viu aquela sereia de pernas cruzadas em sua cama, quase
enlouqueceu. Era um milagre da natureza!
—
Você tá um mulherão!
Lá
estava Nicinha totalmente renovada, pronta para arrepiar! Sair com os amigos
peludos e cheirando a suor?! Nunca mais. Aliás, agora Oscar só saia do quarto
para pedir trégua, mas bem baixinho, de medo que alguém escutasse!
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