NA REAL
Q |
uando as pessoas encontravam Zulú e
Brasinha de “bituquinhas” pelos cantos, sentiam muita inveja e comentavam que
não sabiam de onde vinha tanta “melação”.
Ela era sequinha como batata palha e ele parecia um fiapo de linha amestrado. Claro. Não comiam e nem bebiam. Só viviam de puro amor.
Este fanatismo
começou como uma doença desde o primeiro dia que avistou aquele príncipe
desencantado fugido dos contos de fadas para viver um romance misterioso com a
borralheira Zulú. Escreviam bilhetinhos desenhados, trocavam comidinha na boca
um do outro e faziam questão de demonstrar o tempo inteiro que estavam
totalmente envolvidos num só coração.
Também tinham
apelidos carinhosos como “bebê”, “xuxuca” e “gatuna”. Todos os dias arrumavam
um motivo especial para comemorar:
“ Um mês após a
primeira piscada”.
Juravam que seria
amor eterno, mesmo que fosse para viverem numa moita na beira da Praia
Vermelha, sem lenço e sem documento, apenas no maior love. De papo para
o ar, felizes para sempre.
Zulú não tinha palavras, ideias e nem assunto.
Brasinha era um
pato morto. Nunca falou sobre política, religião ou futebol e apesar de tanta
encenação cinematográfica pouco se conheciam de verdade.
Só que a vida não
se resume em um desenho animado com finais felizes a cada episódio, porque aqui
fora o mundo é de carne e osso.
Após pouco tempo
de namoro, eles marcaram a gloriosa data do casamento. Tudo estava muito lindo
e cheio de graça.
Brasinha se achava
um bem sucedido vendedor de sapatos e exigia que Zulú parasse de trabalhar como
doméstica para se dedicar exclusivamente ao novo lar. Para ele o importante
seria a roupa pendurada no varal, o feijão com torresmo no capricho e o lençol
de bolinhas comprado no crediário em treze vezes sem juros.
O casal maravilha
estava cego de amor feito dois periquitos apaixonados. Até que por zica do
destino, ou olho gordo das fofoqueiras encalhadas, aconteceu uma tragédia:
Brasinha foi mandado embora do serviço, com sapato e tudo.
Pronto, o mundo da
fofa caiu. Não estavam preparados para enfrentar os problemas conjugais e o
grande amor de Brasinha e Zulú foi para o espaço. Ela se descabelou toda
enquanto seu príncipe desencantado se transformou em um sapo do brejo, cheio de
dúvidas e dívidas.
Aquela mulher
louca de paixão sumiu de mala e cuia para a casa da mamãe, acreditando que na
novela das oito tudo seria diferente. Envelhecer numa moita, vivendo de pão
duro e água de chuva, nem morta. Brasinha ficou pasmo de desgosto. Caiu na
bebedeira, perdendo o pouco que tinha no balcão do bar do Totó.
Estava no fundo do
poço enquanto Zulu se acorrentava aos pés da cama para não ir ao seu encontro,
já morta de saudades. Não suportava ver seu Brasinha "maravilha" definhado pela
sarjeta, clamando piedade com uma caneca de alumínio na mão:
— Uma esmolinha para
um pobre infeliz! - resmungava.
Não, aquele não
era o seu, sempre seu, príncipe do amor. Resolveu escrever um bilhete, pedindo
para que a molecada da rua lhe entregasse imediatamente. Queria marcar um
encontro na praça da matriz onde pudessem conversar melhor.
Às seis horas em ponto Brasinha chegou com os olhos inchados de tanto
chorar, ainda mais seco do que nunca.
Zulú não ficava para trás,
disfarçando as lágrimas com óculos escuros.
Então, o que
fazer? Zulú não suportava mais a distância e
agora tinha certeza que amava um homem de verdade, com seus defeitos, seus
limites e seus problemas. Pareciam dois desconhecidos diante de suas próprias
dificuldades e precisavam unir as forças num único objetivo.
Após horas de
choradeira, resolveram recomeçar. Ela se prontificou a ajudar em tudo que
precisasse. Arregaçou as mangas e conseguiu arrumar um emprego na padaria do
Jair.
Enquanto Zulú
trabalhava fora, Brasinha se descabelava feito louco para deixar tudo um
“brinco”. Com o tempo conseguiram pagar as contas atrasadas, fazer o
financiamento do carro novo e bater a laje da casa.
Ela ainda lhe dava
sopa de ervilha na boca e continuava a lhe tratar por “apelidinhos” carinhosos
como Tigrão e Homem-Cueca. Só que agora era diferente porque haviam amadurecido
com a separação.
Através das dificuldades aprenderam a se conhecer melhor, fortalecendo o companheirismo. Zulú e Brasinha estavam cada vez mais unidos, vivendo um casamento de carne e osso, feito por momentos alegres e tristes. Somente assim poderiam reconstruir uma nova, verdadeira e sólida HISTÓRIA de AMOR.
Na real.
Comentários
Postar um comentário