O Pequeno Grande Cidadão ok
Aquele
vilarejo esquecido do mapa e longe de tanta modernidade tinha seus próprios
costumes e a pessoa mais importante do lugar era o carteiro, porque trazia com ele os recados de amor, saudades e
esperança.
Ele já fazia parte
da história de cada um: o tio Oscar que mudou
para a Capital; o pai desaparecido que nunca
mandou notícias ou o namorado que foi embora para sempre, deixando uma mulher
apaixonada na mais profunda tristeza.
— “Querido tio Luluca, estou bem, na medida do possível. Minha mãezinha encontra-se doente, mas continuamos com fé de que tudo dará certo. Dê notícias. Ah, esqueci de dizer que eu voltei a estudar e logo me formarei professora.
Pausa para os comentários:
—Saudades dessa menina que foi embora para a cidade grande... Leia mais, por favor, Seu Vicente.
Então Vicente estufava o peito para ganhar
timbre na voz:
Momento de indignação e camaradagem ao verem
Roberto se debulhar em lágrimas.
—Ingrata. —resmungou o rapaz, saindo de cena.
—Denise sempre foi falsa! — murmurou entre os dentes— Que se explodam de tanto comer pão amanhecido, velho e duro!
—Nem tudo são flores, amigos... —Desabafava Seu Vicente: — Tenham bom ânimo!
Sonhavam com casa,
comida, dignidade e respeito. Queriam apenas que suas crianças não passassem
fome, que aprendessem a escrever e pudessem ir à
escola para que no futuro Seu Vicente não continuasse a ser o único leitor de
cartas daquele lugar.
No final de todas as tardes, recolhia a bicicleta para o lado da cama e ao dobrar a mochila no armário, se punha a matutar um jeito de trazer, além das cartas, um pouco de dignidade para aquela gente tão sofrida!
Foi quando o
menino Zézito bateu na sua porta logo cedo com um papel de pão amassado dentro
do bolso e pediu para Seu Vicente escrever um bilhete muito importante a um tio
rico que morava no estrangeiro.
Poderia ser uma
carta simples, com letras miúdas e frases
curtas, explicando-lhe que desejava aprender a escrever e ter um uniforme
bonito, para um dia, quem sabe, ser também um
carteiro de prestigio e respeito.
— Por favor, Seu Vicente. Faça
isso por mim!
—Zezito, deixe de ser besta! Que babaquice é essa? Você acha mesmo que esse tio sumido, que evaporou há anos, vai lhe ajudar? Tome seu rumo.
— Tio Inácio é um homem importante! Tem cargos no executivo e entende de leis. — dizia confiante:— Tenho certeza que além de me ajudar, irá trazer o progresso pra esse fim de mundo! Vocês vão ficar com a cara no chão quando tio Inácio aparecer aqui. Ah, se vão!
Seu
Vicente precisava fazer alguma coisa para aliviar o sofrimento daquele menino e
chamou Zezito para uma conversa séria. Enquanto beliscavam uns quitutes e
tomavam suco de acerola, Seu Vicente começou o diálogo:
— Verdade, Seu Vicente. Estou cansado de esperar. Já vai fazer cinco
meses e nada!
— O senhor me ajuda, Seu
Vicente?
No outro dia, todas as pessoas do vilarejo se reuniram embaixo do pé de manga e prometeram para Zezito que ele também seria um leitor de cartas, de poemas e de livros... Leitor de tudo que quisesse ler ali na vila ou nesse mundão a fora!
— Quem mais pode colaborar?— perguntou.
— Eu sou construtor! Eu mesmo construí meu barraco de madeira — disse Thomas, homem matuto da região.
—Conte comigo. Sou Isaac e mexo com
fiação.
— Precisaremos de
todos. Unidos somos mais fortes! -sorriu Seu
Vicente.
—Mas, Seu Vicente,
será que vai demorar?
—Juninho, nós nunca saberemos se não começarmos. Primeiro a gente começa, depois a gente aprimora!
Enquanto isso,
todas as tardes Seu Vicente reunia as pessoas interessadas embaixo do pé de
manga e iniciava a alfabetização.
—Lucas? Amanda? Gregório? Todos aqui?
Ali mesmo, levantariam a primeira escola do lugar porque
acreditavam que a força estava dentro deles e quem quer faz, não manda
recados.Aquele vilarejo simples cresceu a cada dia,
movido pela energia de um povo que sabia e acreditava em seu imenso valor!
Texto escrito em 20/07/2007
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